Roberto Gerin

Resenha O Libertador Roberto Gerin

O HERÓI DAS CEM BATALHAS

LIBERTADOR (119’), direção de Alberto Arvelo, Venezuela/Espanha (2014), traz, em grandes pinceladas, a vida de uma das figuras políticas mais emblemáticas da América do Sul. Para quem, em pouco mais de vinte anos, percorreu milhares de quilômetros no meio das selvas, combateu mais de cem batalhas e libertou meia dúzia de países, contar isso tudo em um filme, em tão pouco tempo de fita, nos parece praticamente impossível. Se a proposta do diretor foi mostrar a trajetória de lutas de Simón Bolívar (interpretado pelo excelente Edgar Ramírez) para libertar a América espanhola do jugo espanhol, o espectador terá aí um bom apanhado geral. Infelizmente, com tantas lutas pela frente, não haverá tempo para mostrar em detalhes, e em carne e osso, o homem Simón Bolívar. O herói, no caso, é o que importa.

Simón Bolívar foi um aristocrata venezuelano, com um nome quase tão extenso quanto o de D. Pedro II, imperador do Brasil. Simón estudou na Europa, pôde ver de longe sua América sendo espoliada pela metrópole chamada Espanha, do rei Carlos IV. Ainda vivendo na Europa, jurou para si e para os que com ele estavam naquele momento que não descansaria enquanto não libertasse a América Espanhola do domínio colonial. E assim foi, e assim ele fez. Era determinado, teimoso, astuto, visionário e idealista. E, no final, um libertador.

Talvez um dos grandes méritos do filme seja ter mostrado que a história é uma engrenagem e como tal ela dá voltas. Um dia é da caça, outro, do caçador. Todo o idealismo de Simón Bolívar e toda a certeza no sucesso de suas propostas políticas e econômicas para o futuro da América do Sul não foram suficientes para que esta mesma América Latina tomasse outro rumo. A política gosta de reproduzir os mesmos mecanismos de controle de poder, enquanto, óbvio, estes mecanismos funcionarem a seu favor. E quando a história deu a volta completa, e isto durou mais ou menos vinte e cinco anos, a elite aristocrática dos países libertos descobriu que era preciso que “El Libertador” saísse desta vida e entrasse para a história. E deixasse agora ela, a elite, impor seu eficiente modelo de dominação, copiado, evidente, da metrópole europeia.

Simón Bolívar entraria para a história de uma forma fulminante, gerando corruptelas ideológicas ao longo dos tempos. Uma delas, a mais conhecida, chama-se bolivarismo. Alguém sabe o que é isso? A crença de Simón Bolívar na democracia era tão forte quanto a de George Washington, o libertador da América do Norte. Então, por que a elite e a classe média brasileiras têm tanto horror ao bolivarismo? Ora, vão dizer, bolivarismo é ditadura populista! Primo bastardo do comunismo! Se esta máxima ideológica for verdadeira, forçoso será admitir que os ideais de Simón Bolívar se perderam no meio do caminho.

Em suma. Sugerimos ao espectador primeiro assistir ao filme, com suas belas fotografias, roteiro consistente e interpretações magníficas, quando então perceberá que de fato a história gira em círculo. Nada muda, a não ser que quem estava do lado do poder, amanhã estará do outro lado, sem o poder, mas sonhando logo em voltar a ele. É assim que a roda vai girando, se não eternamente, com certeza por uns bons bocados de séculos. Enquanto não houver mudanças, tudo continuará como sempre foi. Até que apareça alguém que ache que vale a pena lutar mais cem batalhas.

 

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